domingo, 27 de julho de 2008

Alentejo tem um milhão e meio de sobreiros e azinheiras mortos

Levantamento feito pela Florasul indica que 2,9 por cento do montado está morto e mais 1,8 por cento é um foco de doenças que deveria ser erradicadoÉ um dos mais extraordinários sistemas produtivos, quer pelo valor económico que tem quer pela riqueza natural que gera, pela generosidade e variedade da oferta de produtos, pela resistência a condições agrestes. O montado, tanto de sobro como de azinho, é das maiores riquezas do país mas avolumam-se os receios sobre a sua vitalidade. Um recente inventário dá conta de que um milhão e meio de árvores estão mortas. A Florasul - Associação de Produtores da Floresta Alentejana, com sede em Moura, esteve desde 2004 a fazer o levantamento das pragas que afectam os sobreiros e as azinheiras na região. Para concluir que há um milhão e meio de árvores mortas e mais um milhão de espécimes a abater, dado estarem a servir de colónia para insectos altamente destrutivos, capazes de contaminar tudo em volta. No total, 4,7 por cento das árvores deveriam ser cortadas, incluindo-se aqui aquelas que já estão mortas, que representam 2,9 por cento do total. Pode parecer uma pequena percentagem mas, segundo a FloraSul, é mais do que esperavam encontrar. E sobretudo é muito para um sistema que sustenta uma das principais fileiras do sector florestal - a cortiça - e produções como o porco preto.Chamam-lhe o declínio do montado, um problema com "quadros clínicos" tão variados que a comunidade científica continua dividida sobre o que o explica. A morte de sobreiros e azinheiras leva há anos ao abate de milhares de árvores. Até há pouco tempo, o único indicador para a dimensão do problema era dado pelo número de autorizações passadas pela Direcção-Geral de Recursos Florestais para remover os exemplares secos. Mas este não era totalmente fiável porque, tal como alguns produtores explicaram ao PÚBLICO, dada a velocidade a que as árvores morriam em certas zonas mais afectadas pelo problema, a autorização era usada para deitar abaixo as outras que entretanto secavam. "Além disso, esses pedidos de abates só são apresentados pelos proprietários mais activos, os outros deixam as árvores nos terrenos", explica Miguel Vieira, director do FloraSul. A Universidade de Évora fez também a sua prospecção, com base em imagens de satélite, que indicou um por cento de árvores mortas, adiantou Vieira. Assim, no âmbito do projecto SisProFlor - Sistema Regional de Prevenção contra Pragas e Doenças em Espaços Florestais, em parceria com entidades como a Direcção-Geral de Recursos Florestais e o Instituto Superior de Agronomia, foi lançada uma iniciativa, apoiada pelo programa Agris, para fazer o levantamento das pragas que afectam o montado.Amostragem de 80 por centoPrimeiro, foi feita uma cartografia das manchas florestais. Depois, utilizou--se a metodologia do inventário florestal nacional para então se definir onde seriam feitas as prospecções de terreno consoante o risco. Este foi definido tendo em conta a ocupação do solo, a temperatura e a precipitação, informação que foi cruzada com os pedidos de abate de árvores.Foram pesquisadas 1400 parcelas, o que, segundo a FloraSul, garante uma amostragem de 80 por cento da área florestal total do Alentejo. A validação dos resultados foi feita pela Universidade de Évora e pela Escola Superior Agrária de Beja.Os resultados foram colocados num sistema informático, que, além da informação sobre a sanidade do montado, inclui dados sobre os bichos encontrados e fotografia digital. Foram recolhidas 3500 amostras, que foram analisadas no Instituto Superior de Agronomia. Detectaram-se lagartas verdes, cobrilhas da cortiça, plátipos e capricórnios. Estes últimos insectos são os mais preocupantes porque matam a árvore. "Agora faltava continuar o trabalho porque é necessário fazer o inventário dos fungos no solo", diz Miguel Vieira. Entre estes, conta-se a fitóftora, que muitos consideram ser uma das causas das mortes."Há várias teorias para explicar o declínio, os espanhóis acham que são os fungos do solo e agora até já surgiu um novo agente - o plythium -, por cá fala-se muito das práticas agrícolas, mas o que falta é aprofundar os estudos", defende Miguel Vieira. "Temos tudo em base de dados, a partir de agora é só colocar mais informação para que depois haja um trabalho de relacionamento de todo este conhecimento", acrescenta o dirigente associativo, que já pediu uma audiência ao secretário de Estado das Florestas para lhe apresentar o trabalho.Olhar para o solo"Do que temos estudado, os problemas devem-se à falta de fertilidade do solo, o que fragiliza a árvore tornando-a mais vulnerável à entrada de pragas", diz António Gonçalves Ferreira, proprietário florestal em Coruche e vice-presidente da União da Floresta Mediterrânica (Unac).Por isso, defende, a grande aposta é aumentar a matéria orgânica no solo. "Os 20 centímetros superficiais do solo são essenciais e tudo o que se fizer para promover essa camada é bom para o montado", diz. Daí que nas suas propriedades - que estão certificadas - se tenha abandonado a grade para passar para o corta-mato, que não mobiliza o solo, evitando-se assim a perda de fertilidade e de capacidade de absorção de água e nutrientes.O que todos os proprietários pedem é que se estude a sério o problema. Já houve algumas iniciativas governamentais. Mas que pararamO primeiro projecto data de 2003, quando Armando Sevinate Pinto lançou um programa para os povoamentos suberícolas. Além deste projecto esquecer as azinheiras, os incêndios desse ano deixaram-no na gaveta.Posteriormente, Rui Gonçalves, o primeiro secretário de Estado das Florestas deste Governo, promoveu um programa para os montados, onde se estimulou a cooperação científica em relação ao problema. Mas alterações na orgânica do Ministério suspenderam estes trabalhos. Agora, o actual secretário de Estado, Ascenso Simões, promete voltar a pegar no assunto. "Em finais de Setembro haverá um plano para o montado enquadrado num plano nacional de fitossanidade vegetal, previsto no Plano de Desenvolvimento Rural, que irá abranger os problemas que afectam várias espécies", disse ao PÚBLICO. 2,9% A mortalidade atinge 2,9 por cento dos sobreiros e azinheiras e deveriam ser removidos 4,7 por cento.21.07.2008, Ana Fernandes

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